sábado, 22 de outubro de 2011

Resenha crítica do filme "A Estrada"

Recentemente, comentei aqui que havia iniciado a leitura do livro "A estrada", de Cormac McCarthy, essa semana que passou levei o filme sobre este livro, para passar aos alunos do 3º ano. Eles gostaram muito, e solicitei a eles uma resenha de modo que eles me dissessem o que haviam compreendido do filme. A leitura do livro e o filme deixou me com a impressão que estava diante de uma obra que, embora pareça haver pouco relevância, em filme com temas de catástrofes, este trabalho reflete um espírito marcadamente atual. O fim do mundo, seja por resultado da ação do homem, ou por causas naturais, é o pano de fundo de um tempo que ainda não se acostumou a conviver com as diferenças. O contemporâneo e o "passado", como outro tempo, mas a seu cargo o significado histórico que estamos presos, fez nos todos esvaziados de uma meta, como por exemplo, afirma Fukuyama, em seu “The End of History?” (1989). O fim de uma narrativa coletiva, que dava o sentido de projeto histórico ao homem, depois de revelada sua impossibilidade factual, com a derrocada do mundo soviético, naquele mesmo ano, colocando a contento que o presente se tornara o puro devir, aonde caberia a todos a indagação sobre os limites do seu corpo vivo, se impôs como forma ética e política sobre as agendas de governos, mas também, ao homem comum. Uma educação para este novo viver, aonde todos tem responsabilidade direta, não apenas no comezinho cotidiano do nosso viver, mas também pela ação direta do ato político do voto, como forma de representar-nos no espaço público, super-dimensionado no modelo adotado pelas democracias no ocidente, ainda não foi inventada.
As experiências e valores compartilhados por pai e filho, neste livro maravilhosamente triste, agora rodada em película, são como uma cálice de angustias, de dois mundos, aonde sonhamos com uma estrada que pudesse de fato salvá-los de si mesmos.
O filme, estrelado por Viggo Mortensen no papel do pai, com a surpreendente atuação de Robert Durvall, astro de "Apocalypce Now" (1979), como o velho andarilho da Estrada, revelasse pelas aproximações um daqueles filmes ícones, que devem entrar em nossas videotecas, pois faz uma espécie de homenagem a Costa Gavras, com seu "La Petite Apocalypse" de 1992. Menos pela estética do mestre grego e sim por temas como a política e a dor gerada por regimes totalitários. "O nome de Costa Gavras está·associado à consciência polÌtica, devido ao seu espirito desafiador e a sua responsabilidade social, qualidades que imortalizou em seus filmes", como lemos em "O Olho da História - Revista Eletrónica Edição Nº 7", que mostra que "suas obras não são panfletos políticos, mas documentos que registram a petulância e a injustiça de regimes e governantes tirânicos."
Neste ponto o diretor de "A Estrada", John Hillcoat, pela associação que fazemos aqui, entre estas produções podem estar de acordo, filme e livro fazem jus a dimensão política da condição humana de que ter compartilhada sua existência significa sofrer a necessária escolha de ser livre para se livrar dos preconceitos. O conflito que encontramos nos sobreviventes do holocausto, e que aparecem nos filmes de horror colocam-nos diante de uma determinada humanidade que muitas vezes temos esquecido. Os preconceitos, bem como o valor de um princípio, quando ouvimos apenas a fala do "filho", durante os momentos mais decisivos da pequena história destas vítimas de um cataclísma global, são indícios de que aqueles mundo "já se encontravam separados", este é o derradeiro drama vivido peço cinéfilo, ou mesmo um leitor desatento. E eles se escondem nas armadilhas da qual acreditarmos, de que sabemos "o que fazer" em situações limitrófes.
Os melhores filmes são aqueles que, volta e meia, assistimos novamente. "A Estrada" é um destes casos raros. A medida que voltamos a assistitr filme, podemos notar outras entradas, através das quais podemos observar a matiz de angústia que atrevessa a história dos dois peregrinos em busca de segurança, e assim, nos atentar para os verdadeiros limites dos quais fala o tempo do filme, aquela que é a fina camada entre a razão e a loucura. Neste e no outro mundo.

Somos como aquelas velhas e secas arvores da floresta, que desabam quando o solo já não pode nos oferecer mais os nutrientes de nossa vida significativa. O fino suporte de nossa subsistência psíquica arremeda diante da vida frente a natureza em estado bruto, não há Deus a que recorrer, como diz MacCarthy e "aparência do mundo" esta desnuda. Fica evidênte o seu canibalismo. Não se trata, pois de uma obra sobre catástrofe, mas da experiência humana diante da impotência quando "tudo" não significa mais nada; a verdadeira tragédia do homem é a perda da sua humanidade, o fio que nos sustenta está ali diante de nossos olhos, e leva a nossa "chama": como diz o pai do garoto: "Sabia apenas que a criança era a sua garantia. Disse: - Se ele não é a palavra de Deus. Deus nunca falou".

Uma aluna saí da sala aonde passa o filme. Peço que ela seja forte, ela retorna, cabisbaixa. Penso nas palavras do autor, "o meu mundo inteiro no seu", sua chama desapareceu atrás da porta no escuro da sala. Fico em pé olhando o pátio, alguns alunos sentados ao longe conversam na sombra do muro da escola.